21/02/2013

International Higher Education

Nalanda Redux: será possível criar uma universidade de nível mundial no Bihar rural?

Philip G. Altbach
Altbach é diretor do Centro para o Ensino Superior Internacional de Boston College. E-mail:altbach@bc.edu
O governo da Índia e de Bihar, com o apoio da Cúpula do Leste da Ásia, está ressuscitando a Universidade de Nalanda, do século sexto, perto de suas instalações originais na região rural do norte de Bihar. Recursos consideráveis foram prometidos para o projeto, que se encontra atualmente em fase de planejamento. Impressionantes elos internacionais já foram estabelecidos. O conceito é, sem dúvida, maravilhoso – recriar com o equipamento moderno um verdadeiro tesouro intelectual e cultural da Índia antiga. O plano para a universidade tem como foco as humanidades, ciências sociais, a ecologia e a administração – e não a habitual ênfase na engenharia e tecnologia. Mas é preciso fazer uma série de perguntas práticas e conceituais de grande seriedade.
 
Localização, localização
O local escolhido para as instituições acadêmicas é de importância fundamental. Para a Universidade Internacional de Nalanda, que deseja atrair os melhores e mais brilhantes da Índia e de todo o mundo, a questão da localização é de relevância especial. Será que os melhores estudantes e professores se sentirão atraídos pela ideia de morar na zona rural de Bihar? Infelizmente, esta é uma possibilidade improvável. As melhores mentes querem estar próximas do centro da vida intelectual, cultural e política. Os estudiosos querem se misturar facilmente a seus pares e valorizam a facilidade de viajar. A internet facilita a comunicação entre os eruditos, mas não pode substituir a interação humana direta. Os melhores acadêmicos dão valor ao conforto, que não se resume a bons laboratórios e bibliotecas, mas também museus de arte e até um conjunto atraente de restaurantes e cafés.
 
Nas últimas décadas, a experiência na Índia e em outros países mostra que é difícil construir universidades de ponta longe dos centros. Vários dos Institutos Indianos de Tecnologia originais ficavam perto de grandes centros urbanos, mas fora deles. Assim, havia espaço para a construção do campus, permitindo ao mesmo tempo o acesso relativamente fácil a uma comunidade intelectual mais ampla e aos centros urbanos. Algumas das novas universidades centrais, bem como os novos Institutos Indianos de Tecnologia, localizados longe das cidades e comunidades, enfrentam dificuldade para atrair os melhores professores e alunos.
 
Há exemplos de instituições acadêmicas recém estabelecidas nos “campos verdes”. Sem dúvida a mais cara delas é a Universidade de Ciência e Tecnologia Rei Abdullah, localizada em Jeddah, Arábia Saudita. Próxima de uma grande cidade, beneficiada por uma concessão orçamentária de bilhões de dólares e ligada às melhores universidades do exterior, seu sucesso nem assim é garantido. Atrair os melhores acadêmicos para a Arábia Saudita não é tarefa fácil. É importante o fato de o Rei Abdullah, criador da universidade, tê-la mantida separada do governo saudita, tendo seu próprio orçamento e recursos independentes. Ele não queria que a nova instituição tivesse seu funcionamento prejudicado pela lentidão da burocracia do governo. Este exemplo pode ter certa relevância para a Índia.
 
A Universidade de Ciência e Tecnologia de Pohang, por outro lado, parece representar um sucesso significativo, mesmo estando localizada numa cidade provinciana da Coreia do Sul. Com apenas 20 anos de existência, ela conta com boa colocação nas classificações globais. Como instituição privada, ela foi beneficiada pela fartura de recursos da Companhia Siderúrgica Pohang. Décadas atrás, o governo japonês instalou uma universidade tecnológica na ilha de Okinawa, longe das ilhas principais do arquipélago, fazendo um imenso investimento. Muitos a consideram um sucesso, mas parece ainda não haver uma opinião formada a respeito do resultado do projeto.
 
Algumas das melhores universidades públicas americanas também podem trazer lições importantes. Dentre as melhores delas, a maioria foi fundada no século 19, dentro de centros urbanos ou perto deles – a Universidade da Califórnia, em Berkeley, por exemplo, fica perto de São Francisco, e a Universidade de Michigan fica perto de Detroit, enquanto a Universidade de Illinois, em Urbana-Campaign, fica no meio dos milharais. Por mais que esta última seja uma universidade de qualidade, ela não conta com a mesma distinção de Berkeley ou Michigan – e sofre em se tratando da disputa pelos melhores professores.
 
Universidades como “projetos de desenvolvimento”
Os governos de muitos países escolhem o local de novas universidades com base numa série de fatores. Os estudantes de uma área podem carecer de um local conveniente para o estudo. Uma região específica pode necessitar de investimento ou desenvolvimento. Ou os políticos de uma determinada região podem ter uma voz especialmente poderosa. Há em geral boas razões para instalar instituições do ensino superior em locais que possam ser beneficiados por elas em termos de crescimento econômico, acesso ao estudo ou outras metas sociais louváveis. A Índia costuma obter um sucesso considerável no emprego desta tática.
 
Entretanto, é sempre um erro tentar se valer da localização de uma universidade de pesquisa de alto nível para atingir metas de desenvolvimento. O investimento inicial é considerável, e as chances de sucesso são limitadas. O fato é que as necessidades de uma universidade de pesquisa são bastante especializadas e não podem ser comparadas com as de uma instituição acadêmica voltada principalmente para o ensino.
 
A localização da nova Nalanda é ditada pelo local histórico da Nalanda original, e não por metas específicas de desenvolvimento. Entretanto, é bem provável que parte da motivação seja trazer a Bihar recursos e modernização – fala-se até em mudar um aeroporto de lugar.
 
Pode funcionar?
São consideráveis os desafios enfrentados pela nova Nalanda na sua tentativa de se tornar uma universidade de nível mundial. Como já foi dito, sua localização é um fator bastante negativo, podendo até ser determinante. O dinheiro também pode se tornar um problema – a construção de uma universidade de nível mundial é extremamente cara, especialmente num local rural e subdesenvolvido – mesmo com a assistência de doadores estrangeiros e do governo central. O financiamento dos primeiros estágios do desenvolvimento é importante, e os níveis de suporte financeiro devem ser mantidos no decorrer do tempo para garantir o sucesso. Enquanto instituição que planeja – com razão – enfatizar a ecologia, o desenvolvimento, o estudo da paz e outros “temas leves” do mesmo tipo, a Universidade Internacional de Nalanda vai enfrentar dificuldade para obter reconhecimento nas classificações internacionais, que medem principalmente as ciências exatas e biológicas. Neste caso a melhor tática é esquecer as classificações, mas isto não é fácil de fazer. O envolvimento de muitas agências, do governo central e do estado, pode criar gargalos e burocracia – algo que costuma ser frequente na Índia e em outros países.
 
Talvez o melhor plano de ação seria preservar o nome e o espírito de Nalanda, mas transferir a universidade para uma localização mais prática.