03/05/2005

exame.com

Diversificação de produtos e mercados para exportação é lenta

O que de fato vem ocorrendo é um movimento gradativo de equilíbrio dos grandes blocos e países como demandantes das vendas brasileiras

Deve-se ponderar o alcance da diversificação de produtos e mercados para as exportações brasileiras. É verdade que as vendas para países do Oriente Médio, África e Ásia vêm crescendo muito em termos relativos. No mês passado, o caso mais extremo foi o de Mali, para onde os embarques cresceram 2 467% ante abril de 2003. Mas o parâmetro decisivo é a participação no total do comércio exterior brasileiro, neste caso, e em muitos outros, insignificante. Voltando ao exemplo de Mali, o imenso salto relativo em vendas levou as exportações brasileiras para a casa dos 4,6 milhões de dólares em abril, meros 0,05% dos 9,202 bilhões de dólares faturados no mês.

 

Segundo Rubens Barbosa, presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a alta porcentual das vendas para os mercados não tradicionais é natural, simplesmente porque os níveis das vendas brasileiras para aqueles países até pouco tempo atrás eram muito baixos. Portanto, esses avanços não devem se tornar o foco da política comercial brasileira, por falta de relevância. Por exemplo, a participação do Oriente Médio no comércio exterior brasileiro continua em 3,5% do total, na comparação do primeiro quadrimestre deste ano com mesmo período de 2003.
 

Nos quatro primeiros meses do ano, os três principais compradores de produtos brasileiros continuam sendo mercados clássicos: Estados Unidos (7,01 bilhões de dólares), Argentina (2,79 bilhões) e China (1,63 bilhão). O que de fato vem ocorrendo é um movimento gradativo de equilíbio dos grandes blocos e países como demandantes das vendas brasileiras (veja tabela abaixo). A fatia da União Européia caiu 11%, para menos de 24% das vendas. A participação chinesa, isolada do resto da Ásia, recuou mais ainda, 20%, para 4,8% do total. Ao mesmo tempo, a contribuição da América Latina para o faturamento externo brasileiro cresceu 9%, para quase 22%. Além disso, 90% das vendas para a região foram de produtos manufaturados.

 
Manufaturados
Mas o avanço dos manufaturados na pauta exportadora também deve ser visto com reservas. Entre janeiro e abril, a representatividade dos produtos manufaturados na lista de produtos vendidos para o exterior subiu de 54,5% em mesmo período de 2004 para 57,1%. O dado, embora positivo, não é conclusivo, segundo Barbosa. "O problema é como se define manufaturado. Pasta de soja é manufaturado, por exemplo", diz o ex-embaixador do Brasil em Washington. "Ainda é preciso identificar melhor o que é industrial, quais os produtos exportados que realmente possuem maior valor agregado."
 
O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) tem destacado, no interior do grupo dos manufaturados, a ampliação de itens com participação tradicionalmente pequena, como bens de informática (avanço de 104% entre abril de 2004 e abril deste ano), veículos e materiais para vias férreas (319%) e motocicletas (103%). Essa evolução comprovaria um processo de diversificação da pauta brasileira de exportação. Mais uma vez, no entanto, o processo é lento e a participação atual no total é bastante tímida. No caso dos bens de informática, as receitas obtidas com exportação foram de 29,6 milhões de dólares, apenas 0,32% do total. O produto campeão em abril foi soja em grão, responsável por 613 milhões de dólares, 1,7 vez o apurado com embarques de automóveis.
 
Persistência
Para Barbosa, o mais importante a notar é que o saldo comercial brasileiro e a corrente de comércio avançam a despeito da pesada e complexa estrutura tributária brasileira, dos juros altos que inibem o investimento em produção, das deficiências na infra-estrutura e do efeito cambial que prejudica determinados setores exportadores, como o calçadista. Mesmo com todas essas amarras, o Brasil ainda vive um boom exportador.
 
Esse sucesso não depende tanto do Brasil. Há uma combinação virtuosa de fatores que estão fora de seu controle. Primeiro, os preços das commodities seguem no mais alto patamar das últimas duas décadas. Depois, o crescimento do PIB mundial em 2004 foi de 6%, com expansão de 9% do comércio global um resultado extraordinário. Ao Brasil, diz Barbosa, cabe aproveitar a janela de oportunidade para fazer a lição de casa. "Essas condições benignas devem perdurar por mais um ou dois anos. São as chances finais para o país desfazer o nó do custo-Brasil", afirma o diplomata.
 
Além da inércia em aproveitar a hora, fazer a lição de casa e evitar uma parada geral daqui a dois anos, o Brasil erra ao menosprezar o mercado americano, diz Barbosa. O desempenho de vendas para os Estados Unidos (35% entre janeiro e abril sobre mesmo período do ano passado) depende exclusivamente de esforços empresariais. "É preciso considerar que o mercado americano vale 1,5 trilhão de dólares e 68% dos produtos importados pelos Estados Unidos entram com tarifa zero", diz Barbosa. "Esse potencial não está sendo trabalhado pelo governo brasileiro."
 
Exportações por blocos (%) de janeiro a abril
 
2004
2005
evolução
Europa Oriental
2,4
2,7
13%
África
4,4
4,9
11%
América Latina*
20,0
21,8
9%
Estados Unidos
20,5
21,1
3%
Demais
7,6
7,7
1%
Oriente Médio
3,5
3,5
0%
Ásia
15,0
14,5
-3%
União Européia
26,7
23,8
-11%
* 12 países, entre eles Chile, Colômbia, Venezuela, Argentina e México
Fonte: MDIC