25/03/2000

O Estado de S. Paulo

Famílias armam barricadas e resistem a despejo

Justiça determinou remoção; Prefeitura alega que área no Jd. Elisa Maria foi invadida

Moradores do Jardim Elisa Maria armaram ontem barricadas na Avenida Cantídio Sampaio, em Brasilândia, zona norte, para protestar contra ordem judicial para despejo de uma área de 8.450 metros quadrados. Cerca de 6 mil famílias deverão deixar o local até terça-feira.
 
De madrugada, o Corpo de Bombeiros apagou as barricadas em chamas, mas os moradores voltaram a criar barreiras pela manhã. Chamada para resolver o problema, a Polícia Militar lançou bombas de gás para dispersar os manifestantes. A avenida, porém, só foi liberada às 15 horas, após negociação entre PM e moradores.
 
A PM Cláudia Virgílio, que comandou a operação, avaliou que "o sol forte ajudou a desanimar o pessoal". Ela espera problemas na terça-feira, quando termina o prazo para o despejo.
 
Riscos - A Prefeitura alega que o terreno, além de invadido, foi considerado área de risco por peritos da Secretaria Municipal de Habitação (Sehab). O padre Claudio Trudelle, na região há sete anos, lembra que durante as chuvas fortes do início de ano não houve nenhum caso de desabamento nas imediações.
 
Os moradores ainda estão revoltados porque um oficial de justiça só entregou as notificações de despejo para algumas famílias no dia 21. "Fizeram de propósito, para que não desse tempo de reagir", reclamou Silvia Neves, de 26 anos, que há dez mora no bairro e é uma das líderes do protesto. Segundo ela, o oficial não deixou as famílias lerem o conteúdo da notificação e disse que a recusa em assinar os documentos não alteraria o desfecho do caso.
 
Estrutura - Muitas famílias moram no espaço em litígio há mais de dez anos e exibem contas de telefone, água e luz do local.
 
Segundo elas, a coleta de lixo e a entrega de correspondência também ocorrem regularmente.
 
Andando pela região, encontram-se quase todas as ruas asfaltadas e vê-se de tudo: mercados, farmácias e igrejas. Uma das últimas é liderada pela pastora Estelita Peixoto, de 67 anos, desde 1986. "Se quiserem derrubar tudo por aqui que derrubem, pois o poder de Deus é maior", afirmou. Depois, porém, admitiu que vai pedir ajuda ao governador Mário Covas.
 
Responsável pelo repasse de leite doado pelo Estado para 450 famílias carentes, a pastora vai aproveitar uma inauguração hoje de manhã para pedir providências das autoridades sobre o assunto. Hoje, os líderes comunitários pretendem assinar uma petição para a juíza da 3ª Vara da Fazenda Pública, pedindo protelação do despejo. Mas a advogada Leonor Duarte avisa que, juridicamente, há pouca esperança de as famílias retomarem o terreno em litígio.
 
Prejuízo - A maioria da comunidade está desempregada e os investimentos feitos por quem construiu sua casa no bairro variam de R$ 4 mil a R$ 16 mil, em média, podendo chegar a R$ 50 mil. Alguns manifestantes faziam questão de exibir os recibos de material de construção durante o protesto. "Pobre quando economiza tira da boca, isso não é justo", desabafou uma moradora.