01/12/2002

revista Ensino Superior

Universidades usam férias para reforma e expansão

Mas não há muita preocupação em unir o pedagógico ao arquitetônico

Férias cada vez mais curtas preocupam Marcos Ribeiro Campos. Não é porque ele gostaria de descansar mais. Engenheiro civil formado pela Universidade Federal de Juiz de Fora, esse mineiro de 53 anos é o responsável pelas obras da Universidade Metodista de Piracicaba, para onde se transferiu há 25 anos com a missão de construir um campus inteiro – o Campus Taquaral.
 
O problema é que ele tem cada vez menos tempo hábil para colocar os prédios e dependências dos quatro campi da Unimep prontos para uma nova rodada escolar. A manutenção é feita no dia-a-dia, mas não há como evitar uma concentração de tarefas no período do fim de ano. "Fim de ano sempre foi uma correria, mas ultimamente é ainda mais. O período de férias ia de inícios de dezembro até final de fevereiro. Só que, pouco a pouco, os cursos foram invadindo dezembro."
 
A equipe de Marcos é formada por três profissionais no Departamento de Engenharia e dez empregados da equipe de manutenção – entre pintores, serventes, pedreiros e encarregados. Todos vão trabalhar à plena carga nessa entressafra, de 15 de dezembro até, estourando, dia 20 de janeiro. A missão, agora, é entregar todos os prédios revisados e em perfeitas condições de operar em 2003. Não é à toa que o engenheiro deixa escapar uma certa aflição: "Tem muitas alterações para fazer, e neste ano o Natal e Ano Novo caem justo no meio da semana." O jeito é pedir ajuda. "Para realizar todo o trabalho de manutenção, pintura, refação de fiação etc., contratamos mão-de-obra para trabalhar sob supervisão da equipe ou empreitamos os serviços para terceiros." Mas a filosofia de resolver as coisas com gente de casa continua predominando. Há até uma marcenaria própria, conta Marcos, que confecciona móveis e objetos de uso interno.
 
Além do Taquaral, a Unimep tem o Campus Centro, o de Santa Bárbara D´Oeste e, finalmente, Lins. Cada um mantém um administrador com sua equipe própria para trabalhos corriqueiros de manutenção elétrica e hidráulica, além de auxiliares que fazem o dia-a-dia da manutenção. Na condição de gerente do setor de engenharia e manutenção patrimonial, o papel de Marcos é supervisionar tudo.
 
Além do encurtamento do melhor período para trabalhar mais – quando os estudantes e professores desaparecem – Marcos explica que outro fator fundamental para a intensificação de suas atividades é a fase de grande expansão pela qual a Unimep passa.
 
Em Santa Bárbara, por exemplo, está sendo entregue para uso no próximo ano letivo o Bloco 15, com 2.360 m2, que abrigará salas de aula e de professores. Além do bloco novo, está sendo finalizada a Galeria, um local de convívio e prestação de serviços, com previsão de instalação de 21 lojas, uma praça de alimentação, livraria, banco, farmácia e agência de correios.
 
Recentemente, foram terminadas obras em Lins para dar conta da abertura de três novos cursos: Nutrição, Turismo e Direito. Além das salas de aula, uma complicação extra foram os laboratórios específicos para cada área, uma empreitada que sempre envolve mais detalhes técnicos e especificações para acomodar equipamentos em geral bastante caros. "Construímos ainda quatro laboratórios de informática para atender a todo o campus de Lins", completa Marcos.
 
O critério que rege as obras... é a demanda
Túlio Araripe, 51 anos, engenheiro civil e assessor administrativo da Unigranrio, de Duque de Caxias, planeja seu trabalho de acordo com o número de inscritos para o vestibular, realizado duas vezes por ano. A conta é simples: para cada aluno, pelo menos 1 metro quadrado. "Os padrões de construção são bastante específicos no caso de ambientes de ensino: uma sala para 50 alunos deve ter 7 por 8 metros". Outro cuidado adotado é a segurança e conservação dos equipamentos empregados nos laboratórios.
 
Para Túlio e sua equipe de cerca de 18 pessoas – para 13.200 alunos – as férias do meio do ano nem devem mais ser contabilizadas para efeito de esforços concentrados em reforma ou edificação. "São 10, 15 dias, é muito curto." Para 2003, os desafios a vencer enquanto professores e alunos descansam é construir mais 12 salas de aula, num anexo. No ano passado, foram entregues 18 novas salas. Sempre com o auxílio de pessoal terceirizado. "Os prazos são estreitos, temos de recorrer a empreiteiros."
 
Um desses empreiteiros é a Masterfor. Segundo o gerente Alessandro Gomes Rodrigues, o que há de específico em servir instituições de ensino é a maior restrição para o trabalho. "Não pode ter barulho, tem de aproveitar as noites e fins de semana, porque sempre tem aula. A gente precisa fazer um esforço grande e adaptar-se ao ritmo da universidade. Ela não tem como se adaptar às preferências da construtora."
 
Em Botucatu, a Unifac – União de Faculdades –, instituição com 23 anos na ativa, aproveita sempre as férias para refazer pinturas, reformar móveis e adquirir carteiras. Nesse tipo de manutenção, a universidade dispende R$ 40 mil todas as férias, segundo Renata Martins Coutinho, assessora administrativa. De julho a dezembro de 2003 serão construídas mais 20 salas. Em 2000, foi construída uma biblioteca que custou R$ 150 mil. Normalmente o serviço é realizado por pessoal próprio, mas em casos específicos, em função de cronogramas apertados, a Unifac contrata profissionais de fora. Ao todo são 1800 alunos, incluindo uma Universidade da 3ª idade.
 
Em Marília, a Unimar –desde 1989 como universidade, 30 anos desde suas origens – inaugurou em abril de 2001 seu Hospital Universitário, com 129 leitos, 5 centros cirúrgicos e UTI com 12 leitos, o que exigiu um dispêndio de 50 milhões de dólares.
 
O pró-reitor José Roberto Marques de Castro explica que o campus está em constante manutenção. "Nós não paramos, não é só nas férias que as coisas acontecem." Depois da grande obra que foi o hospital, o desafio desta vez é pintar todos os 13 blocos do campus, numa área de 352 alqueires (a Unimar fica encravada numa fazenda experimental). Apenas em pintura, o gasto será de R$ 12 milhões. A mão de obra é própria, e numerosa: 84 funcionários. "Não diria que manter mão de obra própria é melhor, porque há os encargos, mas a qualidade é inegável e o atendimento é imediato." No caso do hospital, uma boa parte foi terceirizada por pressões de tempo de execução da obra. Além disso, a parte tecnológica exigiu pessoal qualificado.
 
Na hora de reformar, a UMC, de Mogi das Cruzes, consulta três ou quatro empreiteiras antes de fechar negócio. "Algumas são contratos anuais de manutenção", afirma o engenheiro Laudicir Zamai, diretor de infra-estrutura da universidade, que ainda destaca uma inovação no ramo: são os usuários da universidade que fazem as sugestões de mudança. "Projetos são realizados por setores da própria escola, professores e alunos propõem desenho, ouvimos os bibliotecários etc." O engenheiro conta que, após apontadas as principais necessidades ao longo do ano, dá-se início às reformas. "Obra de maior envergadura é realizada durante os recessos, julho e final de ano. Manutenção, como pintura e troca de equipamentos, são feitas no dia-a-dia", explica.
 
Grande obra a UMC realizou recentemente, com a construção do campus Villa-Lobos, de 24 mil metros quadrados de área construída, na zona oeste de São Paulo. Entre três propostas, foi escolhido o projeto de uma empresa que não é especialista em faculdades, a Par Arquitetura, de São Paulo. O Investimento total (terreno ao acabamento) foi de R$ 29,6 milhões.
 
A Universidade de Franca também vai fazer ampliações, mas dentro do próprio campus. Será construída a partir de janeiro uma biblioteca central de 6 mil metros quadrados – ao custo de R$ 2 milhões. O término da obra está previsto para julho de 2003. A estratégia de construção da universidade foi "invadir" o estacionamento, adquirir uma área nos fundos do campus e transferir para lá os carros.
 
As ambições expansionistas não param por aí. Segundo o pró-reitor acadêmico, prof. José da Silveira Maia, até o final do ano que vem a universidade vai inaugurar um Centro de Tecnologia e Pesquisa, com 3 mil metros quadrados – mais R$ 2 milhões de investimento.
 
O orçamento anual para manutenção preventiva – executado por uma equipe interna – é de nada menos que R$ 800 mil.
 
Na Unisantos, um campus inteiro será inaugurado em fevereiro do ano que vem, quando comemora 50 anos desde suas origens como faculdades isoladas. "É uma obra de magnitude inédita", comemora a reitora, Maria Helena Lambert. Com seus 6.200 alunos, a universidade vai concentrar nesse edifício todos os laboratórios, tanto da área de saúde quanto engenharia e tecnologia. Oito anos atrás, a universidade construiu um prédio próprio para a pós-graduação, que abriga 800 estudantes. Desde então, nenhuma grande construção havia sido empreendida.
 
A responsável pela construção do novo campus em Santos foi a PBR Engenharia, que ao longo dos anos acabou se especializando em obras de reforma ou expansão de escolas e faculdades. Nestes ambientes de ensino, os princípios adotados pela arquiteta do escritório, Vânia Maria da Silva Joaquim, são a segurança dos alunos e a praticidade da manutenção. "Tudo tem de exigir pouca manutenção, porque esse quesito em geral é complicado, tratando-se de escolas." Vânia também cita um cuidado especial com o visual. "Nós utilizamos muitas cores, fica parecendo um shopping, e o estudante se sente bem."
 
Critérios pedagógicos
Para evitar intervenções "não pensadas" no espaço físico de ensino, o Cedac – Centro de Educação e Documentação para a Ação Comunitária, ONG voltada ao desenvolvimento da educação – decidiu produzir um livro com reflexões aprofundadas sobre reforma e expansão de escolas. "Espaços e Pessoas" foi lançado em 21 de novembro, com o apoio da Vale do Rio Doce, Embraer e Suzano, dos institutos Telemar e Takano e do escritório OZ Design. A Unesco também avalizou o projeto, que agora foi encampado pelo MEC.
 
O livro procura unir a abordagem arquitetônica com a pedagógica, uma preocupação infelizmente pouco comum. É assim que, além das salas de aula, os pátios, corredores e até banheiros são pensados, pela proposta do Cedac. "A premissa é que o espaço em que se dá a aprendizagem deve não só ser cuidado, como estar confirmando na prática tudo aquilo que se prega", explica Tereza Perez, uma das coordenadoras da ONG.
 
Marcos Campos, da Unimep, expressa uma outra preocupação: a falta de troca de experiências e informações com outras instituições de ensino superior. "Seria interessante que os encarregados dos setores de engenharia e de manutenção patrimonial das Universidades trocassem mais informações e criassem um banco de dados com nomes de empresas."